domingo, 17 de julho de 2011

Uma Fábula sem Moral

Em certa vida natural, muito parecida com a nossa, tão parecida, que por não saber o nome das espécies que lá habitam, utilizarei a nossa como referência. Existem três espécies de animais, uma delas, extremamente predatória, que poderíamos comparar a um tubarão com asas, mesmo desnecessários adjetivos, repetiria: faminto, feroz, complexa e perfeita máquina de matar. Outra espécie, assemelhada ao dócil coelhinho, também vive por lá, de fácil reprodução, naturalmente presa fácil e parte da cadeia alimentar da primeira. A terceira espécie, em nada deve ao nosso homo-sapiens, tanto em inteligência como em burrice. Raras vezes inteligente, raras vezes consegue enfrentar e sobreviver ao ataque da primeira. Também devora a segunda, porém, não devia, pois é uma dieta que via de regra lhe leva a morte por indigestão, assim como também faz parte da cadeia alimentar do primeiro, sendo o prato principal, com o bom coelhinho sendo um mero antepasto.

Porém, o forte também tinha seu ponto fraco: a reprodução. A mesma ferocidade em devorar também tinha em copular, desta feita, rapidamente tinha-se uma enorme população de tubarões voadores, população esta que rapidamente dizimou todos os que faziam parte de sua cadeia alimentar, ou pelo menos, grande parte.

Vendo-se sem comida, a espécie com grande senso de sobrevivência, acabou no canibalismo, se alimentando uns dos outros.

Mas alguns homens e coelhinhos haviam sobrevivido e quando os tubarões voadores não mais espreitavam em cada canto, em virtude da seleção natural que havia sido implantada pelo canibalismo, estes voltaram aos poucos, ao convívio da vida em comum e retomaram o ciclo natural.

Sagaz leitor substitua homem por trabalho, coelho por ignorância e tubarão por capital. O tempo do verbo, a sintaxe e a correta aplicação gramatical deixo ao seu encargo, a mim já me basta uma fábula sem moral, que passou há existir muito tempo depois de Esopo.

Os desenhos, mais que luxuosos, são do MESTRE Luiz Gê, feitos
por ocasião do disco "Tubarões Voadores" de Arrigo Barnabé.


domingo, 10 de julho de 2011

Algo sobre Monopólios e Crises

Em recente postagem do Professor Toni, na qual ele encerrava com quatro perguntas, comentei algo (um pouco) do que escrevo abaixo, sobre a dicotomia entre monopólios e livre concorrência. Engrossei um pouco o caldo e faço minha própria postagem. Vamos lá:

Com quem (ou o que) se preocupa o capitalismo? Seria com os consumidores (da primeira pergunta)? Com os trabalhadores (da segunda)? Com o equilíbrio do mercado (da terceira)? Com o dinheiro público (da quarta)? Respondo, com auxílio luxuoso do “Mouro”, que observou ser a passagem do capitalismo competitivo ao monopólio (na verdade ele anteviu, já que em sua época não havia este) apenas uma forma do sistema retornar ao seu equilíbrio (dele, sistema – ou seja, apesar da “forma”, o sistema é o mesmo, seja livre concorrência ou monopólio), perdido em eventual crise, isto é, do modo pelo qual se livra do excesso de capital, existente. Sim! Neste caso excesso atrapalha e sempre haverá uma nova forma de se estabelecer um novo ciclo de valorização deste (capital).

Em resumo, as crises também acabam sempre levando o sistema a criação de monopólios!

As crises sistêmicas não são uma “falha” de mercado e sim é o modo pelo qual o mercado funciona. Este brilhante insight é de Schumpeter, que junto com Keynes, completa minha santíssima trindade.

Quando se torna insuficiente a poupança gerada pelo fluxo circular da economia, há a necessidade irrefutável de se recorrer ao crédito para fornecimento dos recursos demandados pelo empresário (na abordagem de Schumpeter, o “empreendedor”), via capitalista, via de regra, os bancos, porém, a maximização irrestrita dos lucros (possíveis ou não – por que não dizer ganância?) via alavancagem irresponsável, acaba sempre criando um monstro, ao qual damos o nome de crise. Nenhuma expansão de crédito dura para sempre, certamente diria Minsky.

Marx também tem sua abordagem quando coloca que a própria competição, vai levar a destruição dos mais fracos em favor dos mais fortes, assim criando naturalmente uma situação monopolística.

Por quê? Por conta da fragilidade da alavancagem! Se uma empresa com capital de 10 milhões toma emprestado 1 milhão, não para capital de giro (pois o valor seria elevado), mas para investimento, porém, a mesma não consegue determinado retorno que pague este 1 milhão adicional, tendo um prejuízo de 10% sobre seu capital (por causa de uma recessão, por exemplo), a empresa estará perdendo 20% do seu capital (1 milhão de prejuízo + 1 milhão que não conseguiu “realizar”). Se a empresa, para piorar a situação, fizer “apostas” erradas no mercado financeiro (como a Sadia, por exemplo), acaba quebrando e sendo absorvida pela concorrente.

Olhando para o Brasil atual, temos cerca de 70% do consumo concentrado em 10 empresas “gigantes”, quando até mesmo O Globo não consegue mascarar, via a reportagem de hoje, no seu caderno de economia (infelizmente menos lido que o da TV – clique no link).

Temos (eles e não nós): AmBev, BRF-Brasil Foods, Coca-Cola, Hypermarcas, JBS, Kimberly-Clark, Nestlé, Procter&Gamble, Reckitt Benckiser e Unilever.

Não reconhece os nomes? Que tal estes: Omo, Kibon, Seda, Lux, Hellmann's, Arisco e Knorr, algumas “marcas” somente da Unilever, presente em 86% dos lares tupiniquins. Que tal Sadia, Perdigão e Resende, marcas da BRF-Brasil Foods, responsáveis por 90% do salame e outros quitutes que nos entram goela abaixo, conhece?

No meio acadêmico, onde a teoria da livre concorrência ou concorrência perfeita, na qual se baseia os economistas clássicos, é ótima para introduzir o aluno na matéria, mas não corresponde ao mundo real, em decorrência do irrealismo de suas hipóteses (paro por aqui para não me alongar mais no economês), porém, o ideal é o inimigo do bom e o monopólio (em teoria) é a visão do inferno para um mercado livre (para quem não o tem, maioria), sendo que ninguém em sã consciência acredita que ele possa ser corrigido ou controlado pelo governo, senão, obviamente não haveria o monopólio, pois bastaria ao governo somente encorajar a competição e o próprio governo abster-se de criar seus próprios.

Como vemos, ainda existe muita garrafa para ser vendida...