sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Estratégia - Musashi

Estátua de Miyamoto Musashi em Kumamoto - Japão

Em recente trabalho com amigos, sobre estratégia, onde fugi um pouco da economia e entrei na administração, elaboramos alguns tópicos sobre estrategistas famosos, onde acabei indo para minha "outra praia", o caminho da espada, tentando traçar um paralelo entre técnicas marciais com seus correspondentes "práticos", ao nosso cotidiano ou histórico ocidental. Aí vai...

Estratégia
Miyamoto Musashi


Baseado no livro “Go Rin No Sho” – Um Livro de Cinco Anéis

O livro de Musashi está profundamente carregado de filosofia Zen, Xinto e pelo Confucionismo, não apresentando simplesmente (o que já seria muito) uma tese sobre estratégia de luta e sim, nas palavras de Musashi, “uma orientação para os homens que desejam aprender estratégia”, assim, de uma forma mais ampla e estando sempre além da nossa compreensão imediata.

Foi escrito dois anos antes de sua morte, quando se isolou para viver em uma caverna, aproximadamente aos cinqüenta anos de idade. Musashi dividiu seu livro em cinco partes:

Terra: Onde destaca que o caminho da estratégia, não é apenas o caminho da esgrima, deve-se separar um simples lutador de espada, do verdadeiro estrategista, pois o segundo estuda todas as coisas, desde as menores, como as maiores. Realiza um pequeno esboço de seu livro, comparando o ofício do guerreiro a outros, como o ofício do comerciante e do carpinteiro. Afirma que aquele que derrota um homem pode derrotar dez e aquele que derrota dez, pode derrotar cem, assim sucessivamente, demonstrando a estratégia em larga escala;
Água: Inicia nesta parte, suas aplicações técnicas (para os que conhecem Kendô, fica bastante claro), com técnicas onde “nos moldamos” ao adversário, assim como a água, que adota qualquer forma;
Fogo: Nesta parte, o combate torna-se mais feroz, destaca a importância da velocidade nas decisões, escreve “o treinamento para matar, se faz por meio de muitas lutas”. Destaca-se o conceito de esmagar, onde diz que quando houver a possibilidade e o inimigo mostra-se fraco, não deve haver clemência, devendo-se esmagá-lo de uma vez por todas, “sem respeito e sem lhe conceder espaço para respirar”;
Vento: Descreve o caminho e técnicas de outras escolas de sua época, pois o guerreiro deve conhecer a técnica de seus oponentes, assim Musashi registra os pontos insatisfatórios, um a um;
Nada: Com linhas extremamente filosóficas diz: “No Nada está a virtude e nenhum mal. O Caminho tem existência, o espírito é o vazio”. De difícil compreensão, grosso modo, Musashi nos leva a procurar não um Nada existencial, que nada possui, mas o Nada como a possibilidade do Tudo, como a antiga parábola zen da xícara de chá...

Conhecer simplesmente as técnicas ou estratégias não é o suficiente, é o modo de aplicá-las, quando frente a frente com o inimigo, que lhe dá a verdadeira eficiência. Musashi apresenta centenas de estratégias, algumas de imediata compreensão, outras nem tanto. Seguem algumas e suas respectivas "traduções":

MAAI – Distância

A diferença entre um principiante e o mestre, é que o segundo dominou a arte de usar o espaço a seu favor, manipulando, movendo-se sutilmente, o suficiente para não ser atingido, nem mais, nem menos e aproveitando-se da proximidade, contra-atacar sem defesa. É importante saber até onde o inimigo pode atacar, até onde sua arma alcança, seja na relativa proximidade de uma espada ou na distância de uma flecha.
O presidente de uma multinacional, tem muito mais poder no país onde tem sua sede, na medida que se afasta de sua sede, sua influência irá diminuindo. Dentro de sua empresa, existem executivos que sentam a seu lado, nas reuniões por exemplo, com maior poder que executivos distantes, por causa da proximidade.

TOKOSHI – Cruzar a longa distância com velocidade

Quando se está em TOMA (longa distância), deve-se tomar a iniciativa de aproximação, pois a única segurança na guerra, é avançar e destruir o inimigo. O principiante recua quando atacado, o que é um grave erro.
Nós ocidentais usamos a máxima: “a melhor defesa é o ataque”. Às vezes não basta ser agressivo, mas ser agressivo o suficiente, não dando chance ao revide.

SHIKOTAI – Perto do inimigo

Chegar tão perto do inimigo, que ele não tenha tempo para manobrar.
Como negociantes, que abrem um negócio próximo do concorrente, sendo que os próprios anúncios e propagandas deste, servirão para vender os produtos do estrategista.

FUKURAMI - Expandir o inimigo

Fazer com que aquele, que está entrincheirado, saia e se expanda, assim tornando-se fraco.
A Alemanha nazista, lutando em diversas frentes, perdeu sua força e foi derrotada.

SHUKOTAI – Manter a arma mais próxima

Esta estratégia ensina que devemos manter nossa arma, mais próxima do corpo que o normal, assim diminuindo a distância entre nós e o nosso inimigo, obviamente válida, desde que o inimigo não perceba, estando assim sujeito a um ataque de surpresa.
Estocar um determinado produto, antevendo um aumento da demanda, imediatamente satisfazendo-a, quando os concorrentes ainda terão que efetuar pedidos de compra.

HYOSHI – O tempo de execução

Cada coisa no universo tem seu ritmo. Um homem grande tende a ser mais lento que um homem pequeno, assim é fundamental conhecer o ritmo do inimigo, para escolher a estratégia vencedora.
O mesmo conceito é válido para as empresas pequenas e empresas grandes, pois não são as grandes derrotando as pequenas e sim as rápidas derrotando as lentas.

KATSURI – Mudar de velocidade

Pode-se ganhar, mudando de velocidade, forçando o inimigo a um ritmo que não seja seu ritmo natural.
Os debatedores ou vendedores, costumam muitas vezes falar rapidamente, de modo a não dar tempo ao interlocutor racionar, desta forma, aceitando seus argumentos.

MINARI – Aparência

Uma imagem ou aparência forte pode amedrontar o inimigo, fazendo que ele cancele seu plano de ataque, pois a melhor vitória é quando vencemos sem a necessidade do combate. Devemos considerar não nossa aparência real, mas como nosso inimigo nos vê.
O negociante sabe que uma aparência próspera é um importante sinal de lucros. Muitas empresas sobrevivem às crises, não porque eram bem sucedidas, mas porque aparentavam ser. Veja a diferença de conseguir captar algum recurso (num banco, por exemplo), indo de short e chinelo ou indo de terno e gravata.

UTSURAKASHI - Contagiar

As emoções são contagiantes. Ao adotar uma expressão tensa, podemos induzir nosso adversário a este estado de tensão, porém, atacamos tranqüilos e relaxados. Ou parecemos despreocupados e desinteressados pelo combate, assim, quando o adversário relaxar, atacamos furiosamente e o destruímos. O objetivo é levar o adversário a ter o mesmo tipo de sentimento que (aparentemente) temos. As crianças, inconscientemente usam esta técnica.

ZENTAI – Corpo total

Deve-se atacar o corpo todo do inimigo e não somente uma parte. Não dirigir a ação somente para as mãos, ou para a cabeça e sim enxergar o oponente como um todo.

KADO – Cortar um canto

Quando não puder atacar com um golpe contundente, ataque o que puder.
Os pugilistas usam esta estratégia, ao golpear sucessivamente o fígado do adversário, até extinguir por completo a resistência deste, propiciando o nocaute.

MAKURA OSAE - Manter sob pressão um travesseiro

Usa-se esta estratégia, quando se quer controlar o oponente através da restrição do movimento de sua cabeça.
Nas tomadas de poder, usa-se esta estratégia, eliminando sumariamente os líderes oposicionistas, assim foi feito em Cuba, no Chile e outros países.

SUTEMI - Sacrifício

Estratégia do sacrifício, onde se aceita uma pequena ferida, em troca da derrota total do inimigo. Uma pequena perda momentânea, por uma vitória final.
Os kamikazes japoneses foram um exemplo deste tipo de estratégia, apesar de não ganharem a guerra, graças a ela, mantiveram-se nela por mais tempo, até que os Estados Unidos, usaram KOKOROZUKI.

KOKOROZUKI - Golpe fatal

O objetivo é o coração do inimigo, para o golpe fatal e decisivo.
No final da 2ª Grande Guerra, os Estados Unidos, usaram sem clemência a bomba atômica, para ganharem e terminar a guerra

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Aprendiz de Homero - Nélida Piñon

Reproduzo parte do texto, de Pedro do Coutto, que apesar do nome, não é parente, publicou na Tribuna da Imprensa em 17/04/08...
*
"Em Aprendiz de Homero, seu mais recente livro, Editora Record, Nélida Piñon parte em busca do grande poeta épico(...) Talvez - suponho - todos os grandes artistas da palavra tenham de algum modo tentado alcançar Homero. Aprendizes dele, como agora se define a romancista(...)."

"Aliás, todos os dias, de uma forma ou de outra, nos deparamos com usinas do pensamento humano. Incansáveis, inesgotáveis, criativas, produtivas, construtivas, resultado da ansiedade por saber e transmitir. Impulso muito comum também aos jornalistas. Escrever é produzir, é transmitir, é traduzir situações e interpretar afirmações. Clarificando-as para milhões, até bilhões de leitores no planeta, que necessitam e esperam pela produção e pelo consumo. Esperam por nós. Por isso acho que os que se sentam para escrever, seja qual for o conteúdo, estarão sempre praticando um ato solidário. "

"Os escritores e os jornalistas, com as penas de ontem, como Machado de Assis e Oto Maria Carpeaux, com as teclas leves e sensíveis de hoje, são movidos pelo compromisso de chegar a um ponto, encontrando-se consigo mesmos, através dos outros, como na bela e insuperável definição de Simone de Beauvoir, quando se refere à procura da mulher pelo homem. Que é busca de si mesmo por intermédio da imagem feminina. Procuramos, todos nós, na vida, na arte, no jornalismo, aquilo que ela também interpretou como o impulso à busca da exatidão de uma idéia(....)"

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Os normais (nem tanto) da Barão de Mesquita

Numa recente postagem, onde falei de figuras doidas de minha juventude, alguns doces outros nem tanto, a amiga Dora (http://pretensoscoloquios.zip.net/) escreveu: "Cada "tipo" passou pela sua infância e adolescência! E o curioso é que têm muito em comum: a bebida, a malandragem, o gosto pelas "ervas"...". Fiquei eu aqui, encafifado: Será que só conheci doido? Então relembro aqui, para ser justo, também sete figuras, um pouco mais "normais" da Rua Barão de Mesquita. É claro, que normalidade, depende do ponto de vista de cada um:

Nélson: Teria que falar primeiro do Nelson, não por ele ter sido um bom amigo, mas por ser desta lista, o único que já morreu. Nunca fumou (nem do careta), bebia comportadamente, não participando de nossos porres, à tardinha, a base de Coca-Cola e cachaça, o popular sambinha e sempre mostrou-se um cara muito equilibrado. Foi quem me mostrou o primeiro disco do James Taylor e enquanto a maioria era Beatlemaniaca, nós dois éramos fãs do Bob Dylan. Formou-se em engenharia e depois arquitetura (ou vice-versa) e após aquele período bravo, na busca do primeiro emprego, encontrou-se na área financeira de uma multinacional, chegando rapidamente a diretor, migrando (à peso de ouro) logo após para outra. Casou, dois filhos e realizava alguns sonhos que o dinheiro pode comprar. Mas a genética, implacável, que havia levado sua mãe ainda jovem, através de um câncer (acho que no pâncreas), fez o mesmo com meu amigo...Antes dos trinta e cinco...

Juninho: Praticamente foi quem me ensinou a tocar violão. Ouvido privilegiado, enquanto eu sofria com as cifras, ao J. bastava escutar a melodia e tirar a mesma das cordas. Me apresentou o disco "O Último Concerto de Rock", onde ouvi pela primeira vez Neil Young (foto) cantando Helpless (http://www.youtube.com/watch?v=FxGcAm0EkTU) e eu nunca mais fui o mesmo. Como hoje (ainda), é um dos meus melhores amigos, não posso falar mais dele, senão falaria mal...

Portuga: Mesmo depois, já adulto, não conheci uma pessoa que gostasse tanto de dinheiro. Enquanto a turma, na maioria, falava das meninas, futebol e cerveja, o Portuga já falava de Bolsa de Valores, concurso público e seu sonho de trabalhar na Petrobrás. Nos rachas, nas mesas dos bares, ele era sempre o último a "casar" algum, na expectativa de levar a melhor. A última vez que o encontrei, ele estava na estatal. Filho de professora, sempre estudou muito, determinação é isso aí...

Pitinini: Aos quinze anos, já tinha dois metros de altura, o que causava um certo desconforto. Também filho de professora (assim como eu e o Portuga), sentia-se obrigado a ser CDF e sentar nos primeiros bancos escolares (e eu nos últimos), porém, por causa da altura, era sempre colocado para trás. Também por causa da altura, foi segurança do metrô, seu primeiro emprego e sempre me passou ser um cara extremamente correto, digo isso, pois na época em que a loucura se instalou na rua, ele se afastou e foi cuidar (sabiamente) da sua vida. Volta e meia o encontro, hoje ele é sócio de uma creche. Os pais e mães podem ficar tranqüilos...

Diabo Loiro: Sempre foi o mais forte da turma, pois fazia musculação desde os treze anos. Forte, mas não covarde, nunca o vi meter a mão em alguém sem uma boa justificativa. Pelo seu tamanho corpóreo e cabeleira loira, chamava a atenção, além de ser um bagunceiro de carteirinha (daí o apelido), fato este que nos aproximou, além de sermos bons alunos e não CDF's, o que (acho) irritava a maioria...O reencontrei na faculdade, ele estudando Direito e eu Economia, onde às vezes, bebíamos uns chopes e jogávamos conversa fora, relembrando os tempos de escola. Hoje é Delegado de Polícia e quando lhe perguntei a última vez, se não tinha saudade da época que era fortão, ele me respondeu: "Hoje eu não brigo mais, só uso o dedo..."

Careca: Ganhou o apelido, ao passar para a escola técnica e ganhar o inexorável trote. Casou com a primeira namorada "séria" e dos amigos somente ele e Evandro ainda estão casados com as primeiras mulheres. As duas merecem um troféu. Careca hoje é professor do estado e da mesma escola técnica, onde pode ver outros "carecas" e lembrar de si mesmo...

Wilver: Era da turma um pouco mais velha, aquela dos "malucos", mas nunca o foi. Somente começou a beber depois de velho, quando deu uma relaxada (acho). Antes a vida devia lhe cobrar muito, pois eram somente ele, a mãe e a irmã. Um por todos e todos por um. Guri, entregava remédio de bicicleta, às vezes também lá em casa, quando minha mãe dava uma "caixinha" e falava: "O Wilver é muito responsável...". Foi tesoureiro de banco, motorista de taxi e hoje acho que se encontrou como psicólogo, onde desenvolve um belo trabalho junto à menores de rua...

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Coringa

“Eu sou um agente do caos, porque é o caos que provoca o medo(...)A loucura é igual a gravidade, precisa apenas de um empurrão (...) ”

Domingo passado, fui ao cinema com os moleques, meio a contra-gosto, não pelo cinema e as companhias, mas pelo filme, pois apesar de fã das histórias em quadrinhos, as recentes adaptações para o cinema, tanto do aracnídeo, como do meu ídolo-mor Demolidor, o homem sem medo, deixaram muito a desejar...mas lá fui eu. Para meu espanto, digo, pois apesar de já ter lido algumas críticas sobre a atuação desse moço, pintado aí em cima na foto, o Coringa de Heath Ledger (esse é o nome do ator), está i-m-p-r-e-s-s-i-o-n-a-n-t-e! Não é só merchandising de róliude, querendo faturar algum às custas da morte alheia. Colocou a interpretação de Jack Nicholson no bolso, com folga. O dito cujo, que morreu de uma overdose recentemente, um tanto mal explicada ( dizem que foi com remédios, ninguém falou de heroína...), mostra um Coringa totalmente surtado, seria ele o reflexo de Gothan City, que por sua vez, um reflexo do nosso mundo atual? Polícia corrupta até o talo, bandidos sem o seu famoso "código de ética", tão comum no cinema, o tal corporativismo da bandidagem, lá em Gotham, não existe, pois é bandido roubando bandido, polícia matando polícia, altos executivos roubando bandidos (com investimentos nebulosos), tudo no mesmo saco...

Então aparece o tal Coringa, como diz o Pirata (http://www.zinedopirata.blogspot.com/), sacudindo e sacudido, botando pra F...Lá pelo meio do filme, Batman, sempre atormentado, com sua crise de identidade, afinal ele é Bruce Wayne que finge ser Batman ou Batman que finge ser Bruce Wayne? Num diálogo com o fiel Alfred (Michael Caine, menos canastrão que o costume), questionando, quem seria e o que desejaria afinal este "Coringa", tem como resposta do mordomo: "Determinadas pessoas não são movidas pelo dinheiro ou pelo poder, simplesmente querem ver o circo pegar fogo..."

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Figuras da Rua Barão de Mesquita

"...Neste passeio sentimental lembrei de algumas figuras da geração anterior à minha, que pontificavam quando eu ainda não era um delinqüente juvenil, apenas um gurizinho bonitinho e fofinho que jogava bola, pescava nos arroios, assassinava passarinhos a fundaços e já gostava de apedrejar as casas da vizinhança. Na época, eles eram os muito-loucos..."

Naquele prazer de ir de blog em blog, deparei com este: TOCA DO JENS (http://tocadojens.zip.net/ em 21/07/08), de fino trato e escrita, onde ele retratou algumas personas de sua juventude. Inevitável, após ler o post (parte transcrita acima, entre aspas), não lembrar também de algumas figuras da minha...

BRECHINHA: Houve uma batida de carros bem na frente do bar, nada de mais, um ligeiro encostar de pára-choques, mas deu aquele bafafá, formando aquela rodinha, doida pra ver uma briga. Enquanto os motoristas discutiam, Brechinha sorrateiramente entrou em um dos carros, ligou a ignição e partiu em disparada, cantando pneus. O dono do carro ficou louco, começou a gritar, desesperado, assim a pseudo-briga acabou imediatamente. Logo depois ele aparece, galhofeiro, contando para a rapaziada que havia abandonado o carro a dois quarteirões dali. Ele desmontou sua bicicleta e montou um monociclo, tipo aqueles de palhaço de circo, com o qual ficava indo e vindo, se equilibrando numa roda só. Aos dezoito, servindo o exército, fez parte dos motoqueiros da PE, fazendo acrobacias na moto, ficando em pé, plantando bananeira e outras loucuras. Em torno dos vinte e cinco, voltando de uma festa, muito louco, com sua Yamaha RD350, famosa no mundo todo como a moto assassina, bateu em cheio num carro que havia avançado o sinal. Fui ao seu enterro, depois pedimos ao dono do bar que a rapaziada freqüentava, que mudasse o nome para "Brechinha’s Bar", pedido atendido e assim ficou até o Japonês, o dono, também morrer e sua esposa vender...

MACARRÃO: Morreu ao bater com a cabeça no mictório (aquele lugar onde os homens fazem xixi em pé). Chegava no bar já se mordendo, pedia um cachorro magro (cachaça com limão, sem açúcar) e falava coisa com coisa. Volta e meia cantarolava o mesmo blues: " O império do visgo, tchum,tchum,tchum, passou por aqui, tchum,tchum,tchum". De sua autoria, claro, mas a letra não saía disso. Eu nunca soube o que é o visgo... O conheci "normal", caixa do extinto banco Nacional. Quando eu tinha quinze, fui ao seu casamento, ele deveria estar com uns vinte e poucos. No enterro do Brechinha, ele ainda não estava pirado, acho que o Macarrão foi levado pelo pó...

FRANK: A família havia vindo do Acre, ele baixinho, cara de índio, totalmente versado na arte de apertar um bagulho, seus dedos pareciam automáticos. A turma "dos mais velhos", da qual eu, moleque, não fazia parte, ia para sua casa escutar George Harrisson cantar My Sweet Lord e Dylan soprar seu Hurricane. Ainda jovem voltou para o Acre, para tratamento, ninguém mais soube dele...

ALCATRA: Motoqueiro, tinha uma CB400, sempre de jaqueta de couro, era um pequeno comerciante local, revendendo pó e fumo na sua casa. Filho de um coronel da reserva, foi solto pelo menos duas vezes, por conta do pai. Maluco ao extremo, após entrar com a moto pela janela de uma boate (sim, ele conseguiu) foi expulso dos Hell’s Angel’s (sim, ele conseguiu também), que passaram a considera-lo elemento de alto risco, o famoso chave de cadeia. Pelo que sei, ainda continua micro-empresário...

CAPILÉ: Lembrava o Visconde de Sabugosa, bêbado a maioria do tempo, atravessa a rua, para o bar do outro lado, sem olhar, sem pensar e nunca foi atropelado. Certa vez, Fred, um amigo que havia alugado um apartamento nas imediações, pediu ao Capilé que este pintasse o sala e quarto. Fred ao chegar do trabalho, encontra a porta do apartamento escancarada, achou que havia sido roubado, quando entra, vê na sala, Capilé dormindo pelado e abraçado a uma mendiga que dormia todas as noites em baixo da marquise...Faz pouco tempo, o vi, relativamente sóbrio, os pés inchados, mas ainda bebendo...

THE BOY: Bem mais velho que todos nós, tinha a fama de faixa-preta de caratê, bom de porrada, embora eu nunca o tenha visto brigar. Às vezes penso: Será que hoje, é essa fama que tenho, com a molecada aqui da rua? Boa pinta, vivia nas rodas de samba... Há muito tempo atrás, o vi no Jornal Nacional, cobrindo o rosto, outro dia soube que tentava trocar um cheque nas imediações...

AROLDO: Tenho uma terna lembrança de Aroldo, baixinho, folgado, mas de um coração gigante. Foi quem me levou a primeira vez numa boate, daquelas em que as moças dançam quase como vieram ao mundo e ficam passeando entre os clientes, pedindo que lhe paguem uma bebida. Eu, duro igual uma porta, ficava na aba dele, na base do gin-tônica e olhando maravilhado as "meninas". Quando íamos jogar bola, de manhã cedinho, enquanto a maioria ainda estava com gosto de pão com manteiga na boca, Aroldo já tomava um Sprite com 51, no botequim, nosso ponto de encontro. Hoje está irremediavelmente perdido, não bebe mais, não conversa mais, mal sai de casa...

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

China ou Darcy Ribeiro Contra as Muralhas da Ignorância

A China vem se abrindo econômica e politicamente, isso todo mundo sabe, cantado aos quatro ventos, atualmente os líderes chineses não podem mais se perpetuar no poder. Há na constituição um artigo que impede que os líderes sejam reeleitos por mais de dois mandatos para o mesmo posto.
As relações de trabalho – e a economia como um todo– abandonaram os dogmas socialistas e hoje a economia chinesa se aproxima muito mais de uma economia capitalista do que de uma economia planificada.
A grande preocupação da população é econômica e não política. O nível de vida está aumentando, mas como toda economia capitalista do mundo real, haverão pessoas que serão excluídas desse processo. O medo do desemprego passou a preocupar muito mais do que a liberdade de expressão, mesmo com certos assuntos ainda sendo doloridos, por exemplo temos o movimento separatista do Tibete.
Acusam a China de controlar a imprensa. De fato, existe um controle claro do governo, vários repórteres estão provando isso na pele, nesta cobertura olímpica, porém, nos países ocidentais, esse controle existe, mas não explicitamente, pois servem aos interesses das classes dominantes, havendo assim um controle dissimulado. A verdade é que a China ainda não está preparada para a democracia. A China nunca teve tradição democrática. As coisas sempre foram impostas de cima para baixo e o povo se acostumou a isso. Qualquer coisa imposta pelo presidente Mao, era irrefutavelmente acatada por toda a população, pois estava acostumada a isso, assim como estava acostumada as ordens do Imperador, elemento de coesão há mais de dois mil anos, em um país que sempre foi profundamente hierarquizado.
O processo de democratização, será obrigatoriamente lento. As mudanças gradativas foram a fórmula de sucesso da China. Por que mudar isso agora? Só para agradar os ocidentais? Deng Xiaoping, por exemplo, dizia que as instituições chinesas precisam ser reformadas e previu que a população chinesa estaria preparada para eleições presidenciais em 2049. É um prazo bem longo para os nossos padrões, mas na China (assim como no Japão) não existe este culto ao imediatismo, não há pressa para o sucesso, culturalmente sabe-se que naturalmente, o mais capacitado prospera. Sobre o crescimento na (da) indústria privada oriental (Japão, Coréia e China), na década de oitenta, William Ouchi, escreveu um excelente livro chamado Teoria Z.
Os chineses têm uma grande curiosidade sobre o mundo ocidental, mas a mentalidade de hoje já não é a mesma de vinte anos atrás, onde muitos jovens eram partidários (escondidos) da democracia e acreditavam que os Estados Unidos eram uma espécie de paraíso onde o nível de vida era mais alto e havia liberdade de expressão. Isso mudou porque a mentalidade dos jovens também mudou. A maioria dos chineses não enxergam mais os Estados Unidos como o modelo ideal. Os americanos, este sim, atualmente vêem a China como ameaça à sua hegemonia econômica(pois a China deixou de ser puramente mercado e passou a ser concorrente) e usam a bandeira da democracia para proteger seu mercado, aliás, o que sempre foi feito, vide a política extremamente protecionista praticada pelos yankees, em relação a tudo e a todos.
A China é o exemplo do país subdesenvolvido que caminhou para frente. Os chineses não se conformaram, acreditaram e acreditam continuamente que podem melhorar. Qualquer universidade da China, num sábado à noite, está repleta de estudantes nas salas de aula estudando.
O caminho, já se sabe, falta a vontade de alguns para trilha-lo. Faz uns vinte anos, o professor Darcy Ribeiro, deu a senda...

sábado, 9 de agosto de 2008

Dia dos Pais

Ninguém sabe o que é amor de verdade até ter filhos. Tenho dois:Leon e Thales, mas meu amor não é dividido, amava ( e amo) Leon, o mais velho, porém, quando nasceu Thales, este amor não foi dividido e sim duplicado, desta forma, não diminuiu o amor que eu tinha por Leon (repassando, por simples lógica matemática, para Thales) e sim nasceu um novo amor em igual intensidade.
Tenho o amor de um deus, que ama igualmente (deve) todos os seus filhos.
Mas por que uns nascem pobres e outros ricos? Uns nascem aleijados e outros perfeitos em mente e corpo? Agora que sou "o pai" entendo. Caso tivesse um dos filhos, com algum tipo de "problema" ou deficiência mental ou física, longe de mim os queridos espartanos, o amaria de igual forma, pois qual à razão de gritar contra a obra do acaso? A deficiência moral, esta sim imperdoável, o problema, é que a maioria dos deficientes morais de hoje, são filhos dos deficientes morais de ontem, afinal, filho de político, político é...


Eisnten disse que Deus não joga dados com o mundo e ninguém melhor que ele, para entender de análise combinatória, sendo muito mais versado em matemática que o abilolado do Nash (isso, aquele do filme "Uma mente brilhante"), por outro lado, o professor Hyppolyte Rivail andou pregando lá na França que o acaso não existe, assim como o besouro, assassinado anos depois por Chapman, vendeu milhões de disco cantando que o Karma irá nos pegar. Ah! Muito antes desses todos, Lao-Tsé escreveu que o acaso existe, mas podemos mudá-lo...
Cartum: http://www2.uol.com.br/allansieber/cartuns/elite.gif

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Vladímir Maiakóvski

Eu
à poesia só permito uma forma:
concisão,
precisão das fórmulas matemáticas.
Às parlengas poéticas estou acostumado,
eu ainda falo versos e não fatos.
Porém
se eu falo “A”
este “a” é uma trombeta-alarma para a Humanidade.
Se eu falo
“B”
é uma nova bomba na batalha do homem.

1922 (Poemas - Vladímir Maiakóvski. Trad. Augusto de Campos. Tempo Brasileiro, 1967, p. 79)

Calvin vê TV

Não sei se está dando pra ler, mas achei essa tira do Calvin, enviada por email, pelo meu primo Raul Motta, sensacional, como acho que não sou o único míope no mundo, reproduzo o texto dos balões (mas clicando na imagem, dá pra ver maior) ...
1- " Oh! Maior das mídias de massa, obrigado por elevar a emoção, reduzir o pensamento e sufocar a imaginação."

2-"Obrigado pelo artificilismo das soluções rápidas e pela insidiosa manipulação dos desejos humanos para fins comerciais."

3- "Essa tigela de mingau morno, representa o meu cérebro. Eu o ofereço, em humilde sacrifício. Conceda tua luz cintilante, eternamente."


quarta-feira, 6 de agosto de 2008

1986

Pedaço de sol
Pedaço de luz da manhã
Vem toda sã
Vem dançar sobre o meu coração
O sexo não será o mesmo sem nós

Você me trouxe até aqui
e agora me deixa só
(apenas com uns poemas tolos trancados na gaveta)

Me esquece
e
vai.

R. Couto

domingo, 3 de agosto de 2008

Bob Dylan

Domingo, fazendo frio, os moleques no video-game, eu fico aqui escutando música, depois de uma boa leva de blues, onde acabei fazendo um post sobre Robert Johnson, pesquei um CD antigo, do menestrel folk, Mr. Robert Zimmerman. Agora me dou conta, que "falei" de dois Roberts, totalmente diferentes, em pele e religião, um negro e segundo a lenda fez pacto com o cramulhão, outro branco e judeu (depois cristão-novo, depois judeu novamente), mas absolutamente iguais, onde devemos ser.
Desenho de Bob Dylan

"I don't care about economy,
I don't care about astronomy
But it's sure do bother me to see my loved ones turning into puppets
There's slow, slow train coming up around the bend."

Trecho da música "Slow Train", do mesmo Dylan, em sua fase meio pastor, meio cristão-novo. Nesta época, sua voz já estava estragada, mas a música deu uma revitalizada com os belos coros gospels. Depois de letras políticas, achou (nesta época), que a verdadeira revolução era a revolução espiritual ou estava muitiiiiiissimo doente (conforme notícias) do coração e tinha medo de "coisa-ruim" vir lhe buscar? Ou talvez ele tenha resolvido, tirar um grande sarro?

Não me importo, eu gosto desse final, onde diz que não se importa com economia e sim ver seus irmãos (queridos) transformados em marionetes...

Kenjutsu - Depois da Chuva

No primeiro dia de Kenjutsu, foi cumprido o esperado, novamente a relação sempai/kohai (professor/aluno), ficar em seiza (posição de joelhos, com os pés para trás), ser o último da fila e repetir exaustivamente os primeiros movimentos.
Aprendi a "andar" e bater "men" e "kote", bater na cabeça e cortar os punhos do adversário, respectivamente. Conheci nova dor, onde no Kenjutsu, a posição (kamae) inicial é chudan, ou seja, com a perna direita à frente, forçando assim o tornozelo esquerdo, onde fica a base e respectivo peso do corpo. Dor nova, porque sempre optei por lutar com a perna esquerda à frete, na posição clássica do boxe inglês e passar duas horas com o inverso desta posição apresentou-me esta nova dor. Foi muito bom reencontrar velhas dores (joelho direito) e conhecer novas...
Ao final deste primeiro treino, caiu poderosa chuva sobre o Rio de Janeiro, lavando a cidade e minha alma, fazendo-me chegar encharcado em casa.
Anos depois ao ver o filme "After Rain", onde um samurai fica preso em um vilarejo, por causa de uma forte chuva (último enredo do Kurosawa), na época das monções, lembrei do jovem samurai, assim como o do filme, retido no vilarejo, o carioca inexoravelmente preso a sua espada por toda a vida.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Monopólio

Aproveitando que ainda é São João, volto a réplica ao meu comentário sobre a postagem feita pelo Prof. Toni em 10/07 (http://proftoni.blogspot.com/), proprietário de uma capacidade de análise invejável, bem como, do seu recomendadíssimo blog (vide Vale a Pena)

Primeiro quero observar que quando uso a palavra liberal, ou suas variações, tenho medo de ser mal interpretado, dado o tom pejorativo que a mesma anda tendo, assim como política, que já vem carregada com tinta negativa. Liberal vem essencialmente (e irrefutavelmente) de LIBERDADE, sendo esta sim, sem nenhuma mácula (a menos aos homens de bem), onde sonho que um dia seja plena, tanto com liberdade política, como liberdade economica.

Voltando:
Professor, basicamente a discussão gira em torno do monopólio e da estatização ou não deste, ou seja, determinados bens e serviços devem estar na mão do Estado ou da iniciativa privada? A questão acadêmica é uma, haja que o livre mercado na sua teoria é ótimo, assim como o Estado socializando as riquezas também, mas...aí é que começa o problema, pois na prática, tanto observamos profundas distorções tanto no modus socializante, como ao deixar o mercado correr livre, leve e solto...Qual escolher? O menos pior é a minha resposta, mas qual? Segundo Lucas (não o apóstolo mas o autor de "Liberty, Morality and Justice"), numa economia livre os homens maus podem fazer menos mal...Continuando, vamos dar um passeio no meio acadêmico, onde a teoria da livre concorrência ou concorrência perfeita, na qual se baseia alguns economistas clássicos, é ótima para introduzir o aluno na matéria, mas não corresponde ao mundo real, em decorrência do irrealismo de suas hipóteses (paro por aqui para não me alongar mais no economês), porém, o ideal é o inimigo do bom e o monopólio (em teoria) é a visão do inferno para um mercado livre (para quem não o tem, maioria), sendo que ninguém em sã consciência, acredita que ele possa ser corrigido ou controlado pelo governo, senão, obviamente não haveria o monopólio, pois bastaria ao governo somente encorajar a competição e o próprio governo abster-se de criar os próprios. Em "Man, Economy and State", Rothbard faz uma análise bastante clara (aos meus olhos) da situação de monopólio, colocando que o mesmo somente existe em função da concessão de privilégios, diretos ou indiretos (você mesmo mencionou a situação em que várias empresas foram vergonhosamente DOADAS...), assim o criador de monopólios é o Estado, não existindo monopólios invulneráveis, a menos que eles sejam protegidos por este mesmo Estado. A questão da DOAÇÃO de algumas estatais é outro assunto a ser abordado (a discussão se a privatização é boa ou ruim, é uma e a forma como foram feitas, é outra, pois são caso de polícia), assim como o poderoso cartel da OPEP, assim como a Petrobrás (o petróleo é mesmo nosso?), o álcool quebrando (tentando) a ditadura do petróleo, etc. Mas isso é só um post e tudo isso já deu mais que um livro.
Abraços.