domingo, 17 de janeiro de 2010

De Geisel até (quase) Collor (continuação da saga desenvolvimentista)

Continuando posts anteriores sobre industrialização e desenvolvimento, irei de 73 até a década de 80, a priori: Geisel, II PND, Delfim, ciranda financeira e atraso tecnológico...
Fico devendo uma conclusão, que irá abranger nossos dois Fernandos.


Introdução

Os novos mecanismos de taxas de câmbio flexíveis, adotados pós 73, abriram as portas de uma sistemática especulação com moedas, origem esta dos movimentos bruscos do capital internacional (financeiro), que tornou inoperante os mecanismos de ajuste monetário dos balanços de pagamentos.
Após a ruptura definitiva do padrão monetário internacional (o fim de Breton-Woods), os EUA sofreram um desequilíbrio comercial crescente e adotaram políticas monetárias e cambiais que provocaram uma desvalorização lenta, mas contínua, do dólar até 78.
O choque de juros, promovido de FED em 79, representou uma inflexão das políticas monetária e cambial americana, recolocando o dólar no centro do “sistema financeiro mundial”, porém, gerou uma crise econômica mundial, ao levar várias empresas e países periféricos a bancarrota, forçando os demais países capitalistas industrializados a um ajuste recessivo.
Assim, por conta da progressiva flutuação das taxas de câmbio, como do aumento substantivo das taxas de juros, houve inexorável redução do dinamismo do comércio internacional, além é claro, do fator petróleo, que perfazia 13% das importações em 67, sobe para 20% em 74 e 22% em 75, com esta alta do preço internacional colaborando ( e muito!) no rombo da conta financeira do balanço de pagamentos (nossa dívida externa sobe de 3,4 bi US$ em 67, para 17,2 bi US$ em 74).
Além disso, o aumento dos custos correntes (petróleo), conduz à redução dos lucros e a um desestímulo do investimento. Claro que num “ambiente” capitalista, a redução da remuneração tentará ser compensada com reajuste de preços, porém, os produtos importados acabam por possuir elevação superior aos exportados, tanto por necessidade dos primeiros, como por ausência de dinamismo dos segundos, assim, engrossa-se o desajuste das contas nacionais, pois o aumento dos juros passa a ter um componente real, vide que a carga de juros constante passa a requerer para seu pagamento um maior volume de exportações.
Forma-se um círculo sinistro, onde o Brasil paga mais por petróleo, estes “petrodólares” invadem o “euromercado” de câmbio e voltam na forma de financiamento das nossas contas correntes deficitárias (necessário por conta do aumento do juros no mercado internacional).
Esta desestruturação da ordem econômica mundial, ao longo dos anos 70, seria também explicada numa ótica “schumpeteriana”, pelo esgotamento da onda de inovações, que seria um obstáculo ao moto-contínuo expansionista (e fundamental numa estrutura capitalista) ou os EUA não suportavam mais seu imenso déficit público e consagraram uma estratégia visando à manutenção de seu “status-quo” econômico-financeiro, com o fim de Breton-Woods, acionando a maior gráfica do planeta?
Na década de 80, inovações tecnológicas seriam introduzidas pelas principais economias capitalistas, porém, haverá um hiato (tecnológico) de nossa indústria, como veremos adiante...

II PND

As grandes dimensões de várias metas, a massa de recursos necessários internos e externos) envolvida, o reduzido prazo para executá-las (em 5 anos), irrealidade e inconveniência de algumas (programa nuclear, por exemplo), exigiriam (mesmo em 74) uma análise mais profunda sobre a viabilidade do II PND (Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento) no governo Geisel.
Além do mais, em fins de 75 já era claro que a economia mundial estava em grave crise (real e financeira) e que a alta do preço do petróleo não regrediria (pelo contrário, sofrendo novo aumento em 79), o que ocasionaria sérios problemas, por conta do aumento do “juros real”, lembremos que a carga dos juros constantes passa a requerer para seu pagamento um maior volume de exportações.
O II PND partia de uma identificação dos problemas (estruturais) que afetavam a economia nacional em fins de 73:
- Atraso no setor de bens de produção e alimentos;
- Forte dependência do petróleo;
- Tendência a um elevado desequilíbrio externo.
Esperavam resolver estes problemas de forma simultânea, com uma notável expansão do produto agregado, com as principais metas do governo:
- Expansão e modernização agropecuária;
- Expansão da indústria de base;
- Aumento de exportações;
- Maior absorção de tecnologia moderna;
- Desconcentração industrial;
- Reforço ao capital nacional privado e subordinação do capital estrangeiro aos objetivos econômicos fixados.
Neste último ponto, a “porca torce o rabo”, pois significaria uma guinada radical no padrão de acumulação, alterando as estruturas de consumo e de investimento, subordinando (parte) o investimento privado nacional e estrangeiro às metas propostas, bem como o sistema financeiro nacional.
Não só pelo momento (de crise) desfavorável, é fácil perceber a irrealidade política do plano...
Mesmo assim, o governo militar de Geisel, enxergava a necessidade de “apagar” o fracasso recessivo de 64-66 e esta retomada de crescimento, como forma de perpetuação do phoder, of course.
Como instrumentos, tratou de:
- Promover a transferência de parte da poupança privada (então destinada ao financiamento de bens de consumo duráveis) para sustentar os novos investimentos;
- Sob a forma de joint-ventures, atrair investimentos estrangeiros;
- (Re) direcionar os recursos do PIS-PASEP para o BNDE e este fomentar a produção de bens de capital;
- Diminuir a demanda de petróleo, com o programa “Pró-Alcool”;
- Construiu os pólos petroquímicos de Camaçari (Bahia) e Triunfo (RGS), visando a desconcentração industrial (política e econômica de São Paulo);
- Expansão do endividamento externo do setor público (em parte) às custas das Estatais.

Ciranda, cirandinha...

Apesar da ligeira desaceleração, compatível com a tendência mundial, de 74, um pouco acima de 7%, o PIB foi significativamente mais elevado que às economias não-exportadoras de petróleo, tanto desenvolvidas como subdesenvolvidas.
Porém, quanto ao produto industrial, registrou-se queda de 16% em 73, para 4,5% em 75, apesar destes números serem razoalvemente maiores, se confrontados com outros países.
Os sucessivos choques externos (incluindo aí a quadruplicação do preço do petróleo) entre 74 e 80 ampliam o déficit comercial, um desequilíbrio cada vez mais irreversível no comércio exterior.
Além deste (desequilíbrio no balanço de pagamentos), durante o II PND, graças a uma aceleração inflacionaria (erroneamente a inflação foi diagnosticada como inflação de demanda), acabará por generalizar uma indexação da economia.
Simonsen (de quem admiro os quatro volumes de “Teoria Microeconômica” da FGV), malignamente cria o que foi denominado de “ciranda financeira”, ou seja, o governo passa a emitir títulos da dívida, de acordo com os recursos que entram na economia (uma enxurrada de dólares), assim, cresce enormemente a dívida mobiliária. A dívida externa passa a gerar a expansão da dívida interna (lembremos que ao diagnosticar a inflação como de demanda, não se poderia trocar dólares livremente por cruzeiros, contraproducente no caso de uma política monetária restritiva).

Dr. Delfim

Delfim, ao assumir as rédeas da economia em 79, tenta desmontar a engrenagem da “ciranda”, rompendo o circuito dívida externa-dívida mobiliária e desinflar a dívida pública interna, adotando as seguintes medidas:
- Diminuição das reservas cambiais;
- Maxidesvalorização cambial e retirada de incentivos fiscais às exportações;
- Diminuição da taxa de juros.
Entretanto, neste mesmo ano, o II Choque do Petróleo (quem se lembra dos postos fechados nos fins de semana? Por conta do racionamento...) e a subida das taxas de juros internacionais, deteriorando nossa conta corrente que aliado à redução das reservas, gera pressão muito forte sobre o balanço de pagamentos.
O governo joga a toalha e opta por estratégia recessiva, para ajustar o balanço de pagamentos, elevando a taxa de juros internos, aliada a captação de um maior volume de recuros externos.
Entre 81-83, ardíamos em crise, com taxas negativas de crescimento do PIB, do produto industrial, crescente desemprego, queda dos salários reais (ou seja, perdem para tx de inflação). A dívida externa não para de crescer, em função dos empréstimos externos captados pelas estatais e em fins de 82, captulamos integralmente ao FMI, que passa a nos emprestar, somente se adotarmos as medidas aconselhadas (ou impostas?), buscando a qualquer preço o superavit na balança comercial, com uma política monetária e creditícia rígida, reduções e cortes no setor público.

Dança da Garrafa

Para completar o quadro, na década de 80, vivenciávamos um hiato tecnológico, pois o Estado e o setor privado não exerciam atividades de pesquisa e desenvolvimento, com a industria brasileira apresentando baixos níveis de produtividade e custos elevados, assim, perdendo competividade com as economias capitalistas avançadas.
Há profundo desequilíbrio na estrutura produtiva, com “gargalos” nas indústrias produtoras de insumos e intermediários básicos (aço, petroquímicos, celulose, etc.), além de ociosidade em segmentos da indústria de bens de capital, principalmente tratores, maquinas de terraplanagem e construção naval.
Os serviços de infra-estrutura (energia, transportes e comunicações) também constituem-se em gargalos, por conta da redução de investimentos e a defasagem nas tarifas, ao terem como conseqüência a redução da competividade da indústria.
Apesar do “Tcham” ainda não estar nas paradas de sucesso, já descíamos na boquinha da garrafa...

Fim (?)

Fica inexoravelmente impossível, efetuar qualquer análise de nosso subdesenvolvimento, segmentando o país, dentro do contexto internacional. Assim, deve-se tomar como ponto de partida esta totalidade: a economia capitalista mundial. Desenvolvimento e subdesenvolvimento são pólos de um mesmo processo, a acumulação capitalista mundial, onde infelizmente, as relações não são equilibradas.
Collor é eleito com um discurso neoliberal, assim como este (neoliberalismo) campeia em todo o mundo, novos tempos, onde se torna imperativo à abertura comercial e financeira ao capital internacional (para este é claro). O sistema liberal, por trás de enganosa “reciprocidade” (continua...)

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