No capítulo 22[1] de
sua obra “Teoria geral do emprego, do juro e da moeda”[2],
Keynes chega ao ponto onde acredita capaz de explicar o “fenômeno do ciclo
econômico”.
Durante a obra,
ele nos dá o instrumental (que crê) necessário para qualquer elucidação, onde
“os postulados da teoria clássica se aplicam a um caso especial e não ao caso
geral, pois a situação que ela supõe acha-se no limite das possíveis situações
de equilíbrio” (KEYNES, 2009, p.23).
Por essa razão, a análise da
propensão a consumir, a definição da eficiência marginal do capital e a teoria
da taxa de juros são as três lacunas principais dos nossos atuais conhecimentos
que temos necessidade de preencher (KEYNES, 2009, p.42).
Sugere (p. 243)
que o “caráter essencial do ciclo econômico e, sobretudo, a regularidade de
ocorrência e duração (...) se devem principalmente ao modo como flutua a
eficiência marginal do capital”[3].
A eficiência marginal do capital
é definida aqui em termos da expectativa
da renda e do preço de oferta corrente
do bem de capital. Ela depende da taxa de retorno que se espera obter do
dinheiro investido num bem recentemente
produzido (KEYNES, 2009, p. 115)[4].
Keynes em TGEJM,
trabalha em função das expectativas da sociedade de consumo vis-à-vis daqueles que serão
responsáveis pela produção, pois será esta expectativa quanto ao futuro que
poderá influenciar um aumento da preferência pela liquidez[5].
Esta (preferência) “é o ‘preço’ mediante o qual o desejo de manter a riqueza e
forma líquida se concilia com a quantidade de moeda disponível[6]” (KEYNES,
2009, p. 137).
A eficiência marginal do capital
depende não apenas da abundância ou da escassez existente de bens de capital e
do custo corrente da produção dos bens de capital, mas também das expectativas
correntes relativas ao futuro rendimento dos bens de capital (KEYNES, 2009, p.
244).
Segundo Keynes,
uma queda na eficiência marginal do capital será acompanhada por elevação da
taxa de juros, causando assim redução nos investimentos.
A expectativa da
sociedade passa a ser negativa porque tanto os rendimentos caem, como os
“estoques de bens duráveis produzidos recentemente aumentam regularmente”
(p.246) e estoques altos conjugados com baixo consumo são elementos típicos de
uma depressão.
Keynes tinha
matéria-prima “bruta” nas mãos. Escreveu TGEJM em 1936, ainda sob os efeitos da
Grande Depressão e o crash da bolsa
de 1929. Conclui que:
O verdadeiro remédio para o ciclo
econômico não consiste em evitar o auge das expansões e em manter assim uma
semidepressão permanente, mas em abolir as depressões e manter deste modo
permanente em um quase-boom (KEYNES,
2009, p. 249).
Contemporâneo do
New Deal, que “consistiu parcialmente
num esforço enérgico para reduzir (...) estoques (...) por todos os meios”
(p.255). Assinala (e é o foco deste trabalho) que o remédio para a crise
“consistiria em tomar várias medidas capazes de aumentar a propensão a
consumir” (p.251).
Esta propensão a
consumir, quando concretizada, Keynes tratou por “demanda efetiva”. “O ponto de
interseção da função da demanda agregada com o da oferta agregada” (p.38)
Este
conceito foi proposto quase que simultaneamente por Keynes e por Kalecki[7]. Observamos a divergência de formação, onde o
primeiro foi aluno de Alfred Marshall[8] e
o segundo, apoiava-se nas idéias de Marx,
porém, ambos preocupados com o mesmo problema, embora sob ótica ideológica
(naturalmente) tão distinta, acabaram chegando a formulações extremamente
parecidas com relação ao principio da demanda efetiva. O principio da demanda
efetiva diz que o nível de atividade é determinado pela demanda agregada; que
se produz a quantidade dada, não pela capacidade de produção do sistema, mas
pela demanda. E se não existe demanda, a produção não se faz e a capacidade
produtiva tenderá a ociosidade.
Segundo Prebisch
(1998, p.103), a análise de Keynes do ciclo não explica como se desenvolve a
fase de expansão, somente explicando o seu final. Provavelmente resulta daí sua
sugestão para evitar as oscilações, manter-se um estado de “quase-boom”. Uma
sugestão um tanto “etérea”, mas empiricamente fácil de entender. Porém, até
quando é possível manter esse “quase-boom”?
Em 2008 o Fed nos
EUA reduziu as taxas de juro ao nível mais baixo da história, tentando manter o
boom indefinidamente via política monetária e neste momento que escrevo
(outubro/2012), o BACEN vem adotando semelhante política de redução, com a taxa
Selic também em seu viés mais baixo, com o Governo em óbvia tentativa de
incrementar o consumo via crédito.
Em 2008, nos
EUA, sabemos o que aconteceu e agora, para onde iremos? Até quando manteremos
nosso “quase-boom”?
[1] Páginas
243 a 256.
[2]
Doravante abreviaremos para TGEJM.
[3] Maiores
esclarecimentos: TGEJM, Livro IV, Cap. II, p.115 a 122.
[4] Grifos
do autor.
[5] Maiores
esclarecimentos: TGEJM, Livro IV, Cap. 13, p.136 a 142.
[6] Aspas em
“preço” do autor.
[7]
Alguns autores alegam que antes por Kalecki, porém por sua obra ter sido
publicada inicialmente em polonês – seu idioma natal, teve pouca difusão nos
meios acadêmicos.
[8]
O trabalho
de Marshall pode ser entendido como uma continuação do trabalho de John Stuart
Mill,
Adam Smith, e David Ricardo (por esta razão
denominado neoclássico) ao reunir as teorias da oferta e da demanda, da
utilidade marginal e dos custos de produção.
Referências:
GALBRAITH,
John Kenneth. 1929: A grande crise. São Paulo: Larousse do Brasil, 2010
KALECKI, Michal. Crescimento e ciclo das economias
capitalistas, São Paulo: Hucitec, 1983.
KEYNES, John Maynard. A teoria
geral do emprego, do juro e da moeda, São Paulo: Editora Atlas, 2009.
PREBISCH, Raúl. Keynes, uma introdução, São
Paulo: Brasiliense, 1998.
Um comentário:
Muito bem explicado Renato! Um texto simples, bem escrito e muito didático. Parabéns pelo texto!
Frederico Bacic
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