quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Sangue Negro ou Nem todo o petróleo é nosso

Cartaz do filme There Will Be Blood de 2007 ,
traduzido como Sangue Negro,
com interpretação magistral de Daniel Day-Lewis
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O Brasil, como qualquer outro país pobre que se preza, deseja muito aumentar sua participação na nova (velha) ordem mundial, uma das características deste processo é deixar de ser (meramente) um país exportador de matérias-primas e produtos com baixa intensidade tecnológica em troca da importação dos ditos produtos, tecnologicamente superiores. Até aí é chover no molhado, pois é assim desde ciclos ancestrais do ouro e do café, onde desculpem o trocadilho infame, perdemos uma chance de ouro, fato contado em post bem anterior, de 17/06 /08.

Recentemente, o jogo de poderosos interesses se maximizou após a comprovação da existência de petróleo na camada do pré-sal, mobilizando grupos econômicos internacionais do setor de petróleo e seus agentes nacionais.
Do livro "Nem todo o petróleo é nosso"(Autores: Sérgio Xavier Ferolla (engenheiro pelo ITA e brigadeiro-do-ar) Paulo Metri (engenheiro e presidente do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro), com prefácio do economista Carlos Lessa) , tiro importantíssimas informações, explicando de forma simples como o Brasil vem entregando ano após ano o petróleo do país às empresas multinacionais, via rodadas de licitação da ANP. Licitações estas, que estavam suspensas em 2008, mas segundo o Ministro Lobão, voltariam a ser realizadas, porém, não incluindo áreas na camada do pré-sal.

Segue então, resumo mais que resumido:

Tivemos, na década de 50, o movimento "O petróleo é nosso". Nessa época, houve a aprovação e promulgação da Lei 2004, que criou o monopólio estatal e logo depois a criação da Petrobrás, em 1953. O setor de petróleo é estratégico, pois lida com uma fonte extremamente importante para o nosso próprio desenvolvimento. Daí, a importância (estratégica) do monopólio da Petrobrás, pois as empresas estrangeiras, além de auferirem lucros extraordinários (o que por si é ruim, pois lucro de monopólio/oligopólio não é repassado a sociedade, dado que só o mercado perfeitamente competitivo traz esse tipo de benefício), passariam a privilegiar mercados externos (pior ainda, pois atrasaria nosso desenvolvimento). Um monopólio estatal pode ser socialmente controlado, o que é muito difícil de ocorrer com um oligopólio privado.
As petrolíferas estrangeiras conseguiram fazer uma mudança na Constituição Federal, até hoje inexplicável. Porque não acabaram com o monopólio (no texto constitucional), mas a Lei 9.478, criada no governo FHC, acabou com o mesmo, porque você tem no país hoje, por exemplo, a Shell produzindo petróleo em Bijupirá-Salema e mandando toda a sua produção – 70 mil barris – para o exterior. Nós ligamos no Jornal Nacional e ouvimos falar de tudo, mas sobre as rodadas de licitação só aparece ,no dia, uma notícia de 15 segundos, 30 segundos. Sempre falam da arrecadação de bônus, "não sei quantos milhões de dólares", como se isso fosse bom para a economia do país, mas vende-se o petróleo que foi encontrado no subsolo do país por milhões de dólares e depois que for exportado, a empresa dona do petróleo vai auferir bilhões de dólares. Quer dizer, arrecadam-se milhões de dólares, mas alienam-se reservas que são medidas em bilhões de dólares. É por isso que nem todo o petróleo é nosso.
As agências reguladoras são imposição externa, para que as transnacionais, oligopolistas ou seja o nome que for, possam atuar com segurança dentro dos países dominados pelo poder financeiro. A agência é planejada para ser desvinculada do governo eleito – isso é maquiavélico, mas é real. Os mandatos são, em geral, de quatro anos. E os dirigentes das agências não podem ser demitidos, a menos que sejam flagrados em roubo ou alguma coisa bastante comprovada. Mas o presidente da República não pode exonerá-los, como exonera o presidente de uma estatal, sem dar explicação. Eles só são nomeados – isso a sociedade brasileira não sabe – se forem indicados pelas empresas que atuam no setor. O mais grave é que não há indicação de diretor de nenhuma agência que não seja feita por empresas do setor. É a idéia da raposa tomando conta do galinheiro. Isso não é colocado no papel, obviamente. As agências são organismos que não são do governo brasileiro, elas não fazem parte do Brasil. São organismos do capital internacional instalados em diversos países do mundo. Empresas estrangeiras não vêm para o país se sentirem que há controle demais sobre elas. Os cartéis são incontroláveis...

7 comentários:

Marcelo F. Carvalho disse...

Excelente postagem, Renato. Aliás, tem outro filme, igualmente denso e didático, chamado Syriana (acho que é assim que se escreve). Clooney em um papel comedido, mas bem interpretado.
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Abraço forte!

Tânia disse...

Renato, países que insistiram em tentar se auto-sustentar através do sangue negro se deram mal...Os outros investimentos não vingaram...
Ainda acredito que o caminho para o desenvolvimento real deste nosso imenso país é a educação! Que este pré-sal sirva muito além de ser um mero cabo eleitoral.

Vou procurar o Livro do Sérgio.
Beijos

Anônimo disse...

Olha que interessante: qdo li o post passado, me lembrei deste filme. Nele, Day-Lewis é o protótipo da ambição própria do capitalismo, especialmente em seu duelo com o pastor - onde ambos são ambiciosos e completamente desrespeitosos com a população.
Ah... mas o tema é petróleo... e disso sei apenas o que ouço falar. Quer dizer, agora sei um pouco mais porque sou uma eterna aprendiz d"O cara" - meu professor de economia!!! rs
Beijo. E beijo!

Jens disse...

Não é de estranhar que FHC tenha acabado com o monopólio estatal do petróleo: quando presidente declarou que pretendia acabar com a Era Vargas. Conseguiu, desmontou o Estado. Há quem tenha saudade daquela peste. Bleargh!
Um abração, Renato. Elucidativo o post.

RENATA CORDEIRO disse...

4 te leram! Meu amigo, vc pode ir tranqüilamente apreciar o meu novo post no meu Blog, pois devido a problemas com essa joça desse computador, só fiz a crítica de um filme, mil vezes visto, que merece ser mil vezes visto de novo, e postei poemas. Conto com vc.
Um abraço,
Renata
wwwrenatacordeiro.blogspot.com

Prof Toni disse...

Pois é... semana passada li coisas bem interessantes no blog do Nassif e nesta semana a CartaCapital tem matéria muito boa sobre o tema, inclusive com um analista defendendo, com ressalvas, o modelo norueguês.

Renato Couto disse...

Marcelo: Este filme "Syriana, está entre aqueles, que estou "quase" sempre locando, mas acabo deixando pra depois...mas agora vai pro início da lista...

Tania: Concordo com a Eduacação em primeiro lugar, só assim se cresce, investindo parcela significativa do PIB em EDUCAÇÃO,o resto virá naturalmente...

Loba: Afinal, (no filme) o capitalismo também é uma religião...

Jens: Obrigado pelo elogio, é como você disse: FHC, Bleargh!Será que ele salvou algum?

Xará: Vou passar lá...

Prof Toni: Li o post no Nassif e fiz comentário,basicamente meu post, pois a Eliana Cardoso (boa economista, será parente do FHC?), fez um samba doido de Contas Nacionais, pra justificar a exploração externa do pré-sal, tratou PETRÓLEO, como trataria muamba chinesa, interferindo nas ditas contas, pelo aumento da importações (rá-rá´-rá). Não vi a Carta Capital, mas fazendo uma "video-banca", acho que tem algo na CAROS AMIGOS tem alguma matéria...Quanto ao modelo norueguês, dois pontos:1)Só de ventilarem criar outra empresa, quem tem ações da Petrobrás está xingando até mãe de padre; 2)O modelo não se baseia na criação de fundos, com base no lucro auferido com a associação alheia? Nós sabemos muito bem onde são utilizados estes fundos...Vide a CPMF, que era para a saúde e serviu para cobrir os gastos do governo...Outra, quem controlará a exploração? A ANP? (rá-rá-rá)

Abraços a TODOS e bom domingo.
Beijos para as damas...